"Nue": julho 2006

segunda-feira, julho 31, 2006

Para as mamãs: ser mãe um dia permitiu-me crescer e amadurecer como mulher e como profissional. O meu filho trouxe-me a oportunidade de olhar para as crianças com um novo olhar. Vê-lo crescer e participar no seu desenvolvimento, foi o melhor que me aconteceu.
Quero dizer a todas as mães, principalmente àquelas que carregam uma vida dentro de si, que sorriam, que riam, que cantem, dancem…porque ele sente, ouve e partilha todos esses momentos dentro do líquido amniótico, mesmo que protegido dos choques…ele não está protegido dos desequilíbrios emocionais da mãe que o carrega dentro de si. O bebé sente quando a mãe está frágil, quando está triste, quando chora. E torna-se triste também. Dentro da barriga os bebés respondem a esta instabilidade, dando pontapés, contorcendo-se. Outros tornam-se apáticos, sem respostas motoras.
Em consulta acompanho mães que trazem os seus filhos, queixam-se que são crianças com dificuldades a nível da atenção e concentração, são igualmente muito agitadas, irritam-se com facilidade e isolam-se com frequência. Estas mães tiveram uma gravidez difícil, muitas delas viveram experiências desagradáveis que as levaram a perder o controle, a excederem-se, a gritarem e a esquecerem-se delas próprias e da vida que carregavam, que precisava já nesta fase, do maior cuidado.
Aos papás: vocês são muito importantes nesta fase da gravidez (e em todas as outras). Proteger a mulher, acariciá-la, falar com ambos, tocar na barriga, fazer amor. Tudo isso é a forma mais linda de participar no desenvolvimento do bebé que vai chegar. Nesta fase, a mulher sente-se frágil, sente-se feia e com medo desse passo tão grande que vai fazê-la ganhar uma nova identidade: ser mãe.

Ser mãe é uma aprendizagem diária. Não existe um caminho marcado.

domingo, julho 30, 2006

En attendant

“En attendant
J’ai tricoté ta chambre de mes rêves
Blotti ton prénon contre mês lèvres
En attendant

En attendant
J’ai joué devant la glace à être une femme
Réecrit mon histoire pour taire tes larmes

Em attendant
J’ai acheté des robes couleur de bonbon
Que tu me dévores, que je sois ta maison
Ton cheval blanc

En attendant
Je plonge mon nez dans la barbe à papa
Je suis si deux que je tiens plus dans ses bras

En attendant
La vie prend des reflets de sucre d`orge
Ton père noue des écharpes douces sur ma gorge
En attendant

En attendant
Le vent prend des rires d`enfants en rafales
Moi ca m`donne des envies pas trop banales
Pas comme avant

En atendant
Je croise toute la journée celle que j`étais
Toute la journée celle que je serai
En te voyant

En attendant
Il parle toutes les nuits de ce qu`on será
Avec toi, avec toi

En attendant
J`apprends par coeur tous les mots des chansons
Que tu t`endormes, que je sois ton polochon
En attendant

En attendant
La nuit prend des reflets de lune vermeils
Tu te réveilles lové dans mon sommeil
Tu prends ton temps

En attendant
J`ai acheté des robes couleur de passion
Que tu m`adores, que je sois tes saisons

En attendant
J`ai dessiné le monde à ton image
Avec des tons plus doux mais pas trop sages
En attendant

En attendant
J`ai compris les câlins de ma maman
Je crois bien que je t`en donnerai autant…”

Isabelle Boulay

O estímulo mais importante para uma criança, é sentir-se segura. Sentir que existe um porto. Sentir-se segura para explorar o mundo que a rodeia e interagir com os outros. Dar segurança a uma criança significa falar com ela, ouvi-la, fazer coisas com ela e dar-lhe carinho. Eis três coisas indispensáveis: o afecto, a palavra e a partilha.

Educar os educadores

Não somos culpados daquilo que não sabemos mas passamos a sê-lo, a partir do momento em que fomos orientados e iniciamos um processo de aprendizagem.
O trabalho não se faz unicamente com as crianças, faz-se igualmente com os pais. E, muitas vezes são os pais que têm que tomar consciência que é preciso mudar. Esses pais têm dentro deles, feridas de infância que não foram compreendidas e “tratadas”, que fazem deles o que são e afecta o modo de relacionamento com os outros, neste caso com os seus próprios filhos, dando espaço ao silêncio e à violência, seja ela verbal ou física. Falar, significa transpor este silêncio e encontrar um equilíbrio possível.

D., é uma menina de 8 anos. Foi trazida pela mãe à consulta de psicologia, reencaminhada pelo serviço de psiquiatria, devido a uma alteração de comportamento.
D. é filha de pais separados, não reconhecida pelo pai biológico e vive com a mãe, o padrasto e o meio-irmão de 2 anos de idade. A mãe queixou-se sobre o baixo rendimento escolar da filha, as reacções de agressividade por parte desta e também de pequenos furtos em dinheiro. Nos primeiros encontros, D. esteve muito pouco colaborante, pouco faladora e com o olhar muito triste. Olhava sempre para baixo e permanecia muito quieta enquanto sentada.
Hoje, D. conversa animadamente em consulta, vem a correr pelas escadas quando sabe que está atrasada e entra na sala com um grande sorriso. O trabalho com ela permitiu-me perceber o quanto esta criança se sentia rejeitada pelo pai e o quanto isto a afectava, rejeitada pela mãe que se dedicava inteiramente ao bebé e, pelo padrasto, com quem não tinha muita intimidade. A mãe acabou por admitir que não era meiga com ela, que não tinha tempo para se dedicar à filha e que precisava de ajuda pois tinha oscilações de humor frequentes e sentia-se muitas vezes deprimida. Foram feitas varias sessões envolvendo a menina e os pais. Foram feitas alterações nesta estrutura familiar que a tornaram mais funcional, no sentido em que esta menina reencontrou o sorriso e começou a sentir-se importante e desejada.
Um dia pedi-lhe que escrevesse uma carta à mãe…D. pediu-me que não mostrasse a carta à mãe pois tinha muito medo dela. Na carta, D. contou à mãe que achava que ela não gostava dela e que gostava mais do irmãozinho mais novo.
Este apoio deu a esta criança a oportunidade de poder confiar em alguém, de ser ouvida e aceite. Este apoio deu a esta criança um espaço para crescer, diminuir o seu sofrimento, para confiar mais em si própria e poder avançar. Permitiu reparar uma ferida que poderia tornar-se ainda maior um dia e tirar a esta criança a possibilidade de ser melhor.

“A psicologia da bofetada”

A bofetada como instrumento de educação, ainda não foi completamente abolida.
Ao ser agredida fisicamente, a criança sente dor física, sente-se rejeitada por aquele que a agride e vive dentro de si mesma uma reacção de agressividade que pode levá-la a agredir pessoas ou objectos que não estão necessariamente relacionados com a figura que agrediu: agredir um colega, um peluche, a si própria.

Ela tem 6 anos de idade, muito delicada, frágil, queixa-se de dores de cabeça constantes, chora e não quer ir à escola.
Um dia, encostou o rosto à minha orelha e finalmente perguntou:
“…posso contar-te um segredo…?”
- Sussurrei ao ouvido dela: “podes…”
“…a minha professora bate-me na cabeça com uma régua…”

Como entrar no mundo de cada criança? Como perceber o momento em que se pode entrar? Quando é que ela nos permite entrar? E de que forma?

É um desafio permanente. É um desafio que vale a pena, para quem ama esta profissão.

O meu trabalho:

Eu trabalho a tempo inteiro num Centro de Reabilitação Psicossocial Infantil e Juvenil (CERPIJ) no Hospital Central de Maputo e trabalho também em clínicas privadas, para além do trabalho como docente. Integro uma pequena equipa de psicólogas (os) e fazemos o atendimento de casos diversos que nos chegam de diferentes serviços do hospital, de escolas e de outros lugares. Os casos que atendemos mais frequentemente estão relacionados com dificuldades de aprendizagem (e estes casos são muitas vezes uma consequência de problemas mais graves, que podem estar ligados a instabilidades no seio familiar, carências a vários níveis, etc.), abuso sexual e HIV.
Eis a sensação que tenho quando saio do meu trabalho: este é o meu lugar, acompanho cada caso que recebo com toda o empenho, dedicação e em nenhum momento desisto da esperança de recuperação e de reconstrução. Saio do meu trabalho extremamente cansada mas com um sorriso…e as imagens destas crianças, as terríveis histórias que oiço, levam-me a acreditar que a palavra tem uma força incalculável e que o facto de eu não desistir e de me empenhar, leva o outro a acreditar que algo é possível e que existem sempre alternativas.

sábado, julho 29, 2006

“Não existe, para nenhuma comunidade, melhor investimento do que pôr leite dentro das crianças”.
Winston Churchill

Ser psicóloga foi, penso eu, a forma mais inteligente que encontrei de responder às questões que sempre me inquietaram. Foi também uma busca de um lugar onde me pudesse sentir mais segura e mais auto-suficiente. Na ajuda ao outro, interesso-me bastante pela temática relacionada com o abuso infantil e de como se pode criar uma ponte para chegar à criança ferida que existe em cada um de nós e…ajudá-la.

"A violência não é força, mas fraqueza".
Benedetto Croce

Eu
Interrogo-me constantemente sobre quem sou...poderia dizer, sou a forma como sinto as coisas, como reajo a elas, sou aquilo que de mim fizeram desde o meu mais pequeno bater du coeur, desde o meu mais suave bater de asas. Sou também a curiosidade que sempre despertou em mim a vontade de saber o que existe, para além do que parece evidente. Este procurar levou-me a querer saber mais, sempre mais. Continuo a descobrir-me e proponho-me aqui continuar nessa descoberta. Penso que o meu trabalho abriu-me inúmeras portas e deu-me a oportunidade d'aller vers l'Autre. O Outro, l'Autre, é sempre uma experiência inesquecível. Sejam quais forem os termos usados, "ajudar", "apoiar", "acompanhar", é estar ao servico do outro, é ajudar o outro a reconstruir-se, a aceitar um lugar entre outros, aceitar a mudanca, aceitar a ajuda, aceitar a vida.